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segunda-feira, 4 de junho de 2018

Chichibio Cuoco - Um conto de Boccaccio em "Decameron"

I. - Giovanni Boccaccio


Giovanni Boccaccio, nasceu, não se sabe ao certo se em  Florença ou Certaldo, em  16 de junho de 1313 e faleceu em Certaldo, 21 de dezembro de 1375. Ele  foi um poeta e crítico literário italiano, especializado na obra de Dante Alighieri.


 pintura de Boccaccio de corpo inteiro  Filho de um mercador, Boccaccio não se dedicou ao comércio como era o desejo de seu pai, preferindo cultivar o talento literário que se manifestou desde muito cedo. Foi um importante humanista, autor de um número notável de obras, incluindo Decameron, o poema alegórico Visão Amorosa (Amorosa visione) e De claris mulieribus, uma série de biografias de mulheres ilustres.  

O "Decameron" fez de Boccaccio o primeiro grande realista da literatura universal.

Ao ler "A Comédia", de Dante Alighieri, Boccaccio ficou tão fascinado que a renomeou de "A Divina Comédia", título com que a obra seria imortalizada. 

Considerado pelos seus contemporâneos florentinos uma autoridade sobre Dante, o governo da cidade convidou-o, em 1373, a fazer uma leitura pública da Divina Comédia. Apesar de ter feito várias palestras foi acometido de uma doença que o impedia de terminar o projeto, mas o texto com os seus comentários ficou para a posteridade. Encontra-se sepultado na Igreja de São Jacó e Filipe, em Certaldo, na Toscana, Itália. (fonte: Wikipedia)

Boccaccio, Dante e Petrarca são conhecidos como "As três coroas de Florença" e são os protagonistas da literatura italiana. 

Observação -  Vejam os períodos em que eles viveram: Dante (Firenze 1265 – Ravenna 1321) Petrarca (Arezzo 1304 – Padova 1374) Boccaccio (Firenze 1313 – Certaldo 1375)


II. - O Decameron


Decameron é uma coleção de cem novelas escritas por Giovanni Boccaccio entre 1348 e 1353.

foto da capa do livro Decameron    O livro é estruturado como uma história que contêm 100 contos relatados por um grupo de sete moças e três rapazes que se abrigam em uma vila isolada de Florença para fugir da peste negra que afligia a cidade. Boccaccio provavelmente iniciou Decameron após a epidemia de 1348 e o concluiu em 1353. Os vários contos de  Decameron vão do trágico ao erótico; contos de sagacidade, piadas e lições de vida. Além do seu valor literário e ampla influência, ele fornece um documento da vida na época. Escrito no vernáculo da língua florentina, é considerado uma obra-prima da prosa clássica italiana precoce.

A obra é considerada um marco literário na ruptura entre a moral medieval, em que se valorizava o amor espiritual, e o início do realismo, iniciando o registro dos valores terrenos, que veio redundar no humanismo;  Foi escrito em dialeto toscano

III. - O Conto "Chichibio Cuoco"


"Chichibio Cuoco" : Um conto de Giovanni Boccaccio em Decameron


Currado Gianfiliazzi, como cada um de vocês deve ter visto e ouvido, na nossa cidade tem sido sempre um notável cidadão, liberal e magnífico, leva uma vida cavalheiresca  mantendo continuamente em cachorros e pássaros a sua diversão, não recordando agora seus feitos mais importantes. 

Um deles aconteceu quando com seu falcão caçou um ganso perto de Peretola, e encontrando-o gordo e jovem, o enviou a um de seus bons cozinheiros que se chamava Chichibio e era veneziano. E lhe mandou dizendo que lhe assasse e cozinhasse bem para o jantar. 

 gravura contendo o conzinheiro fanfarrão Chichibio assando o ganso enquanto uma jovem parece lhe pedir um pedaço   Chichibio que, parecia ser um fanfarrão, preparou o ganso, dedicou-lhe sua atenção e, com presteza, começou a cozinhá-lo. Acontece que quando o cozido já exalava uma cheiro grande e forte, uma moça da região chamada Brunetta, da qual Chichibio estava fortemente apaixonado, adentrou na cozinha, e sentindo o odor do ganso e vendo-o implorou fortemente a Chichibio que lhe desse uma coxa. 

Chichibio lhe respondeu cantando e disse: “Você não me entende Dona Brunetta”, você não me entende”. Brunetta se sentindo chateada lhe respondeu: “Pela fé em Deus, se você não me der, tu não terás nunca de mim nada que te agrade”, e logo se seguiu muitas palavras. Ao final Chichibio, para não angustiar a bela moça retirou uma das coxas do ganso e lhe deu. 

figura de um serviçal levando o ganso assado em um prato para o patrão   Estando então diante de Currado e alguns hóspedes serviu-lhes o ganso sem uma coxa, e Currado espantando-se chamou a Chichibio, e perguntou-lhe o que tinha acontecido com a outra coxa do ganso Então, o veneziano fanfarrão prontamente respondeu: “Meu Senhor, o ganso não tinha se não uma coxa e uma perna”.

Currado então chateado disse: “Como pode que não tenha senão uma coxa e uma perna ?” Eu não já vi muitos gansos além deste ?”

Chichibio continuou: “Ele é, Senhor, como eu vos digo; e quando lhe aprouver eu lhe mostrarei ao vivo”. Currado, por atenção aos seus hóspedes  não quis continuar  o assunto, mas disse: Então você mostrará ao vivo, coisa que eu nunca vi e nem ouvi, quero vê-lo amanhã de manhã e estarei satisfeito; Mas eu te juro sobre o corpo de Cristo que, se  outra coisa acontecer, eu te farei queimar, que tu com tua mentira nunca se esquecerá, enquanto viveres, do meu nome.

 gravura do Patrão e Chichibio montados a cavalo e olhando para vários gansos que estão apoiados em uma perna só  Terminando então as palavras por aquela noite, na manhã seguinte, quando o dia amanheceu, Currado, a quem a raiva não o deixara dormir, e ainda aborrecido, levantou e ordenou que os cavalos fossem preparados. Ordenou que  Chichibio montasse um cavalo sem raça  e partisse em direção a um riacho, na borda do qual ele sempre costumava ver alguns gansos, e disse: “Logo vamos ver quem mentiu ontem à noite, ou tu ou eu.”

Chichibio, vendo que ainda durava a ira de Currado e que lhe era necessário manter a sua mentira, não sabendo como fazer isso, na frente de Currado, morrendo de medo, de bom grado teria fugido se pudesse. Não podendo, ele se preocupava e o que via, ele pensava que eram gansos que estavam em seus dois pés. 

Mas já perto do riacho, ele chegou a ver antes de todos cerca de doze gansos, as quais se apoiavam todas em um pé, como elas fazem quando dormem; Para o que ele, prestamente mostrando para Currado disse: “Muito bem você pode ver, mestre, que o que eu te disse ontem à noite é verdade, as gansos não tem senão uma coxa e um pé, se você olhar para aquelas que estão acolá“. 

Currado vendo a situação exclamou: “Espera que eu te mostrarei que elas tem duas pernas”. E, aproximando-se daqueles mais próximos gritou “Ho, ho!”. Baixando a outra perna, todos depois de alguns passos começaram a fugir; Onde Currado dirigiu-se a Chichibio e disse: “O que você acha glutão? Dizes que elas não tem duas pernas?”.


 foto de um ganso apoiado em uma perna só.
foto por Avi Drori


Chichibio quase atordoado, não sabendo direito o que fazer, respondeu: “Mestre, sim, mas vós não gritastes “Ho, ho” àquele de ontem à noite”; “Porque se vós tivesses  gritado ele teria baixado a outra coxa e o outro pé como esses fizeram”. 

Currado  gostou tanto da resposta, que toda a sua ira se converteu em riso e alegria, e disse: “Chichibio, tu tens razão: Eu deveria ter feito isso”. 

Então, com sua pronta e agradável resposta, Chichibio acabou com sua má sorte e fez as pazes com seu senhor. 


IV. - Referências


Wikipedia - Boccaccio / Decameron

Chichibio Cuoco - Conto do Decameron - IV Novela da VI jornada.